sábado, 16 de junho de 2012

O Património Geológico Português - Geoconservação e Geoturismo

De forma a completar o post anterior, informo que foi recentemente aprovado pelo Parlamento Açoriano um Projeto de Decreto Legislativo Regional , que prevê proceder a uma alteração do Decreto Legislativo Regional 47/2008/A de 7 de novembro, que consagra o Parque Natural de Santa Maria.


Esta proposta tem como principal objetivo estabelecer normas para a proteção da riqueza paleontológica de Santa Maria, tendo em conta a sua importância para o desenvolvimento local e regional.


Ficamos todos a ganhar! :)

quarta-feira, 30 de maio de 2012

O Património Geológico Português. Geoconservação e Geoturismo.


“Quando viajamos pelo nosso território, temos a sensação de percorrer regiões pertencentes a países diferentes, tal é o contraste que apresentam entre si, o qual é acentuado pelas influências climáticas atlânticas e mediterrânicas. Quando a isto juntamos as belíssimas ilhas da Madeira e dos Açores, de génese vulcânica, de clima ameno, em pleno oceano, bem podemos agradecer a sorte que a Natureza nos brindou. Assim soubéssemos cuidar capazmente do que nos foi dado” (Ramalho, 2004).

Se subirmos ao Pico Alto, o ponto mais alto da ilha de Santa Maria, temos oportunidade de vislumbrar duas paisagens distintas divididas a meio por uma cadeia de picos vulcânicos. Por um lado temos uma área caracterizada pela sua cor amarelo-acastanhada, uma zona mais seca e aplanada, por outro lado temos uma zona verde onde predomina a vegetação, apresentando um relevo movimentado e uma temperatura mais húmida (Monteiro & Furtado,2005).

Se juntarmos ao ponto de vista geomorfológico, o facto de Santa Maria ser a única ilha do Arquipélago dos Açores com “afloramentos de rochas sedimentares, incluindo calcários, calcarenitos e conglomerados, frequentemente com conteúdo fóssil abundante e diversificado” que se intercalam com rochas e materiais vulcânicos (Nunes et al, 2007), podemos facilmente perceber a sua potencialidade como um excelente destino de Geoturismo.

Santa Maria apresenta um rico conjunto de jazidas fossilíferas com fósseis marinhos que datam do Mio-Pliocénico e do Plistocénico. Durante muito tempo não foi atribuída relevância aos fósseis marinhos presentes na ilha. No entanto, em 2002 a investigação científica começa com um grupo de investigação denominado de “MPB – Marine PalaeoBiogeography Working Group”, que teve como resultado “o aumento acentuado de publicações de artigos em revistas da especialidade internacionais, bem como dos livros de divulgação sobre o património paleontológico de Santa Maria” (Ávila et al, 2010). 

“Pedra-que-Pica” uma das jazidas mais imponentes da ilha de Santa Maria.
 Autoria: Paulo Henrique Silva (Siaram.azores.gov.pt)


Para além dos trabalhos de campo que eram efetuados durante o dia, este grupo de investigadores venciam o cansaço, e proporcionavam serões agradáveis à população em geral e a todos os visitantes que estivessem interessados em conhecer os estudos efetuados na área da paleontologia na ilha de Santa Maria – “O Património tem obrigatoriamente que assentar no desenvolvimento equilibrado entre a Investigação Científica, de qualidade e internacionalmente reconhecida, a Divulgação Científica junto do grande público (…)” (Ramalho, 2004).

Apesar da sua importância, verificamos que não existe legislação vigente que proteja a conservação do Património Paleontológico de Santa Maria. O Decreto Legislativo Regional n.º 47/2008/A que consagra o Parque Natural de Santa Maria estabelece algumas normas que abrangem algumas das jazidas fossilíferas existentes. Contudo, penso que tal não será suficiente para a proteção, conservação, gestão e uso sustentável do Património Paleontológico.

A solução poderá passar pela criação de um Paleoparque, que de acordo com Lipps (2009) torna-se crucial para a preservação das jazidas fossilífera in situ, para além dos Paleoparques possuírem um valor cientifico, educacional, turístico e artístico inegável (Ávila et al, 2011).


Felizmente, já se encontram agregados esforços para a criação de legislação específica e para a candidatura da riqueza paleontológica mariense a Paleoparque.



Referências Bibliográficas:
Ávila, S. et al (2010). Os fósseis de Santa Maria (Açores). A Jazida da Prainha. Marine PalaeoBiogeography Working Group. Açores: Vitor Hugo Forjaz (OVGA).

Ávila, S. et al (2011).8th International Workshop “Palaeontology in Atlantic Islands”. Santa Maria Island (Azores). Marine PalaeoBiogeography Working Group. Açores: Vitor Hugo Forjaz (OVGA).

Cachão, M. & Silva, C. (2004). Introdução ao Património Paleontológico Português: definições e critérios de classificação. Associação Portuguesa de Geólogos. Geonovas n.º 18. PP. 13 A 19.

Monteiro, R. & Furtado, S. Descrição da Paisagem da ilha de Santa Maria. Sentir e Interpretar o Ambiente dos Açores. Disponível em http://siaram.azores.gov.pt/geografia/sta-maria/paisagens.html. Acedido a 29 de maio de 2012.

Nunes, J.C; Lima E. ; Medeiros (2007). Os Açores, Ilhas de Geodiversidade – Contributo da Ilha de Santa Maria. Açores: Universidade dos Açores.

Ramalho, M. (2004). Património Geológico Português – importância cientifica, pedagógica e sócio-económica. Associação Portuguesa de Geólogos. Geonovas n.º 18. PP. 5 A.



sábado, 19 de maio de 2012

Ameaças à Geodiversidade e Estratégias de Conservação


“Não é certamente por acaso que as diversas etapas de desenvolvimento tecnológico estão associadas ao uso sucessivo de materiais geológicos: Idades da Pedra, do Cobre, do Bronze e do Ferro” (Pereira et al, 2008).

Muitas vezes esquecemo-nos do papel da geodiversidade para a evolução tecnológica da sociedade e consequentemente para a qualidade de bem-estar com que hoje vivemos. Contudo, tal não significa que os avanços tecnológicos significaram o aumento da consciência ambiental. O incremento de uma tecnologia agressiva, característica das sociedades modernas, e o progressivo aumento populacional levou a uma crescente sobreexploração dos recursos geológicos, que atualmente poderão pôr em causa este recurso natural que tomamos como infinito e garantido mas que afinal é não renovável, podendo ser alvo de destruições irrecuperáveis.

Tal como a biodiversidade, a geodiversidade apesar de aparentar uma estrutura mais sólida, enfrenta inúmeras ameaças, que advém direta ou indiretamente de ações antropogénicas (Brilha,2005).

Brilha (2005), com base no trabalho de Gray (2004), enumera as seguintes ameaças à geodiversidade:

  •  Exploração de recursos geológicos. Neste caso poderemos assistir à ocorrência de ameaças a dois níveis: paisagem e afloramentos. No caso de ilha de Santa Maria (Açores) assistimos durante muito tempo à exploração de inertes na Pedreira do Campo e no Poço da Pedreira, fazendo esta atividade parte integrante da história económica e cultural da ilha. Felizmente, foi criado nos Açores, através do Resolução do Conselho do Governo n.º 182/2009, de 26 de Novembro, o Plano das Atividades Extrativas, que apresenta como um dos principais objetivos a extinção da atividade em locais sensíveis do ponto de vista geológico, ambiental e paisagístico. 
 Imagem: Poço da Pedreira. Geoparque Açores (http://azoresgeopark.com/)
  • Desenvolvimento de Obras e Estruturas. Ao darmos um passeio pelas Zonas costeiras das ilhas dos Açores, principalmente pelas Baías com maior afluência populacional, poderemos detetar vários casos de construção de habitações que provocam a degradação dos recursos geológicos, que para além de constituírem uma ameaça ao valor intrínseco da geodiversidade, colocam por vezes em risco a segurança das populações locais e visitantes.
  • Gestão de Bacias Hidrográficas. Tal como Brilha (2005) refere várias bacias hidrográficas portuguesas foram alvo de construção de infra-estruturas de modo a reduzir o impacto de fenómenos naturais como as cheias. No entanto, a verdade é que estas infra-estruturas pouco contribuem para a redução dos fenómenos e muito contribuem para a degradação da geodiversidade.
  • Florestação, Desflorestação e Agricultura. Se formos a atender às necessidades alimentares de uma população crescente, assistimos cada vez mais à prática de uma agricultura intensiva que recorre ao uso de produtos químicos, o que acarreta consequências irreversíveis como a contaminação das águas subterrâneas e contaminação e erosão dos solos. Felizmente nos últimos tempos já se tem adquirido uma maior consciência ambiental, tentando-se incentivar o regresso à agricultura biológica.
  • Atividades Militares, que com as maquinarias pesadas e bombardeamentos podem trazer consequências equivalentes às mencionadas na agricultura intensiva.
  •  Atividades Recreativas e Turísticas. Mencionei no post anterior um bom exemplo que ocorria numa área denominada de “Deserto Vermelho dos Açores”, atualmente integrada no Parque Natural de Santa Maria e nos geossítios prioritários da ilha.
  • Colheita de amostras geológicas para fins não científicos, como é o caso dos fósseis marinhos que eram levados para “recordação”, assim como as estalactites que eram “arrancadas” pelos visitantes da Gruta do Figueiral, sem qualquer fundamento científico.

      Imagem: Gruta do Figueiral. 
Rui Andrade
  •     Iliteracia cultural. Sem dúvida a iliteracia cultural é transversal a todas as ameaças mencionadas. Se durante muito tempo poderíamos nos desresponsabilizar com base na ignorância, agora já existem diversos estudos na área das geociências que nos permitem adquirir uma melhor perceção da importância dos recursos geológicos. 
    Conhecidas as diversas ameaças à geodiversidade, urge implementar estratégias de geoconservação - “In order to protect geodiversity we need to understand the threats and how they can be avoided or minimised. There is a need to have active geoconservation inventories and a commitment to manage and monitor these sites. The approach to nature conservation should include an approach encompassing all natural values and processes”. (Pemberton, 2007).

     De acordo com Brilha (2005), as estratégias de conservação passam pela criação de uma metodologia que pode ser dividida sequencialmente nas seguintes etapas:
  •      Inventariação
  •      Quantificação
  •      Classificação
  •      Conservação
  •      Valorização
  •      Divulgação
  •      Monitorização
         Ao avaliarmos os procedimentos em cada etapa, torna-se evidente o “porquê” da criação do Geoparque Açores.

       Uma Estratégia de Conservação passa naturalmente por uma avaliação científica dos aspetos geológicos de determinado geossítio. Contudo, um Geoparque é muito mais do que os aspetos geológicos. “Dormindo com os Vulcões”, um artigo publicado na National Geoographic, em que Gonçalo Pereira relata uma viagem aos Açores é um bom exemplo da conjunção da força da Terra com os costumes e tradições identitárias da população açoriana.
       
        No caso específico de Santa Maria, foram identificados 15 geossítios. No entanto, apenas 5 geossítios foram considerados para a Candidatura do Geoparque Açores à Rede Europeia e Global de Parques, apoiada pela Unesco. Os critérios intrínsecos, de uso potencial e necessidade de proteção foram tidos em conta para esta seleção.


Explorando dois dos Geossítios Priotários de Santa Maria e percebendo o “porquê” da implementação de estratégias de conservação ….


Ribeira do Maloás



Ribeira do Maloás
Sentir e Interpretar o Ambiente dos Açores (siaram.azores.gov.pt)

       A Disjunção Prismática da Ribeira do Maloás é um afloramento “único na ilha com estas dimensões e um dos mais belos dos Açores”. (Nunes et al, 2007). De forma prática, poderemos identificar alguns dos critérios referidos por Brilha (2005), nomeadamente raridade, extensão, estado de conservação (boas condições de conservação), possibilidade de realização de atividades pedagógicas (recentemente foi dinamizado visitas de estudo com escolas no âmbito do programa curricular) e atividades turísticas (possibilidade da realização de canyoning).



Ponta do Castelo

 Imagem: Ponta do Castelo. Geoparque Açores (http://azoresgeopark.com/)

        

       Segundo Nunes et al (2007) a Ponta do Castelo “consitui uma das geopaisagens mais importantes da ilha de Santa Maria, evidencia alguns aspetos geológicos adicionais para além daquelas formações e produtos vulcânicos e produtos vulcânicos, como é o caso de escoadas lávicas basálticas com disjunções prismáticas e esfeirodal, hialoclastitos, inúmeros afloramentos de escoadas submarinas (…) e diversas intrusões filonianas, de pendor e espessura variável”.
       Para além do seu valor geológico, no geossítio da Ponta do Castelo predominam as ruinas da antiga fábrica da baleia, um marco da história do povo mariense. Este geossítio encontra-se próximo das povoações, inserido na Baía da Maia, pertencente à Freguesia de Santo Espírito.




     Como estou ligada à sensibilização Ambiental não poderia deixar de referir a importância da educação nas estratégias de conservação. No Simpósio Ibérico do Ensino da Geologia defendeu-se a interrelação entre a geoconservação e a educação - “A geoconservação, ao fomentar a conservação e a valorização de geossítios de interesse pedagógico, está a promover o ensino/aprendizagem da Geologia nos seus mais diversificados contextos. Por seu lado, a abordagem de temáticas relacionadas com a geoconservação permite aumentar a sensibilidade da sociedade para a necessidade de se promover a conservação do património geológico, devidamente integrada nas políticas de Conservação da Natureza” (Brilha et al, 2006).



 Brilha, J.; Dias, G.; Pereira,D. (2006). A Geoconservação e o Ensino/Aprendizagem da Geologia. Simpósio Ibérico do Ensino da Geologia. XXVI Curso de Atualização de Professores de Geociências. Aveiro.


A inexistência de estratégias de conservação devidamente implementadas e integradoras de todos os valores da geodiversidade, poderá levar à perda irreversível do nosso património geológico, da nossa identidade cultural e da potencialidade económica que ainda temos que explorar de forma responsável. 


Referências Bibliográficas:
-Associação Geoparque Açores. Geoparque Açores – nove ilhas, um geoparque. Disponível em http://azoresgeopark.com/. Acedido a 04 de maio de 2012.
-Brilha, J. (2005). Património Geológico e Conservação – A Conservação da Natureza na sua vertente geológica. Viseu: Palimage Editores.
-Brilha, J.; Dias, G.; Pereira,D. (2006). A Geoconservação e o Ensino/Aprendizagem da Geologia. Simpósio Ibérico do Ensino da Geologia. XXVI Curso de Atualização de Professores de Geociências. Aveiro. Disponível em: http://www.google.pt/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&frm=1&source=web&cd=1&ved=0CFQQFjAA&url=http%3A%2F%2Frepositorium.sdum.uminho.pt%2Fbitstream%2F1822%2F5368%2F1%2Fbrilha_dias_pereira_sieg.pdf&ei=N5O1T6SNG8bs8QPtPDdDw&usg=AFQjCNGWgmgCeah4TtZtjC_zYSVIlewXFA. Acedido a 16 de maio de 2012.
-Governo dos Açores. Plano Sectorial de Ordenamento do Território para as Atividades Extrativas da Região Autónoma dos Açores. Disponível em: http://www.dhvsgps.com/pae/pg/oplano.asp. Acedido a 16 de maio de 2012.
-Nunes, J.C; Lima E. ; Medeiros (2007). Os Açores, Ilhas de Geodiversidade – Contributo da Ilha de Santa Maria. Açores: Universidade dos Açores
- Pemberton, M. (2007). A Brief Consideration of Geodiversity and Geoconservation. Manager, Biodiversity Conservation Branch. Department of Primary Industries and Water, Tasmania. Disponível em http://proceedings.com.au/quarrying2007/papers/paper_pemberton.pdf. Acedido a 16 de maio de 2012.
- Pereira, D.; Brilha, J. ; Pereira, P. (2008). Geodiversidade – Valores e Usos. Minho: Universidade do Minho. Disponível em http://www.dct.uminho.pt/docentes/pdfs/jb_pereiras.pdf. Acedido a 16 de maio de 2012.

domingo, 6 de maio de 2012

Atividade 3 - Complexidade da Geodiversidade



Reflexão: Ao consultarmos várias referências bibliográficas, facilmente detetamos que o termo Geodiversidade é complexo e pluridisciplinar. Nas primeiras definições que surgiram o termo restringia-se a aspetos relacionados com a natureza abiótica. Mais tarde, a natureza biótica e o Homem foram também integrados nas definições.
Stanley (2002) chega a afirmar que “biodiversity is part of geodiversity”. Realmente, a Geodiversidade é a base para todos seres vivos que habitam no nosso planeta. O solo é um exemplo perfeito da relação entre a Biodiversidade e a Geodiversidade, assim como os ilhéus que albergam fauna e flora, permitindo a nidificação de diversas espécies de aves marinhas.

Imagem: Ilhéu da Vila (Santa Maria) - Único local de nidificação da espécie Bulweria bulwerii (alma-negra) nos Açores.
Paulo Henrique Silva - siaram.azores.gov.pt

A vida do Homem depende tanto da Biodiversidade como da Geodiversidade, desde os primórdios da sua existência. A caça, a pesca e os abrigos permitiram ao homem sobreviver em interação com a natureza.
Por mais tecnologias que continuaremos a descobrir vamos sempre precisar da Biodiversidade e da Geodiversidade. São o suporte para a nossa vida na terra. Daí, terem surgido termos como Geoconservação e Património Geológico, no sentido de valorizarmos e conservarmos os alicerces da condição humana, abrindo horizontes para todos os valores da geodiversidade, para além do valor funcional de caratér utilitário e económico.
Atualmente, a meu ver, o Homem está cada vez mais consciente da importância do desenvolvimento de uma relação harmoniosa com o meio natural. Uma forma de percecionarmos este facto é através da complexidade e pluridisciplinaridade do termo “Geodiversidade”, que associa uma variedade de processos interativos.


Imagem: Aspetos interativos da geodiversidade
Silva, 2008.

Referências Bibliográficas:
- Documentos cedidos na Plataforma Moodle, no âmbito da UC de Biodiversidade, Geodiversidade e Conservação.
- Simic, S. et al (2010). Geodiversity and Geoheritage – New approach of the interpretation of the terms. Belgrade, Serbia: Institute for Nature Conservation of Serbia. 2University of Belgrade-Faculty of Geography.


sábado, 5 de maio de 2012

Atividade 3 - Geodiversidade – Conceito e Valores



Tal como indicado no post anterior, surgiu em 1992 na II Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Convenção da Diversidade Biológica. Desde então têm sido editadas várias publicações sobre biodiversidade, assim como se tem assistido a uma crescente preocupação com a extinção de espécies animais e vegetais, que constituem a natureza biótica do nosso planeta.

No entanto, o termo Geodiversidade é mais recente e não tem sido alvo de tanta cobertura mediática, não sendo ainda a sua definição consensual, mesmo dentro da própria comunidade geológica. Como indica Brilha (2005) “(…) de acordo com Gary (2004), o termo surgiu por ocasião da Conferência  de Malvern sobre Conservação Geológica e Paisagística, realizada em 1993 no Reino Unido.”

Ao fazermos uma simples pesquisa na Web verificamos que existem mais documentos relacionados com a Biodiversidade do que com a Geodiversidade. E então qual será a importância da Geodiversidade que “compreende todos os aspetos não vivos do planeta Terra, ou seja, a natureza abiótica?” (Nunes et al, 2007)

De acordo com a definição da Royal Society for Nature Conservation (Reino Unido) a geodiversidade consiste na variedade de ambientes geológicos, fenómenos e processos que dão origem a paisagens, rochas, minerais, fósseis, solos e outros depósitos superficiais que são o suporte para a vida na Terra”. Sendo assim, é impossível dissociarmos a Biodiversidade da Geodiversidade, dado que a natureza abiótica é base da natureza biótica, na medida em que providencia as condições básicas de sustento e influencia todos os seres vivos que constituem o ecossistema, no qual o Homem se insere.


A Geodiversidade tem um valor inegável. Se olharmos para o caso dos Açores, ilhas vulcânicas, onde a Geodiversidade é assinalável, poderemos observar todos os critérios de valorização propostos por Gray (2004):

Valor intrínseco – A Geodiversidade tem valor intrínseco, independentemente da sua utilidade antropocêntrica.
Valor Cultural – Como é o caso da “pedra de cantaria de Santa Maria”, elemento fundamental das típicas casas marienses, extraído de um cone vulcânico denominado de Pico Vermelho.
Valor estético – Ao realizar diversos passeios pedestres pela Natureza dos Açores, verifica-se que a beleza paisagística é incontestável.
Valor económico – A extração de calcário para a produção de cal e a extração de argila para o fabrico de telhas no Geossítio da Gruta do Figueiral (Santa Maria) foram durante muito tempo fontes de rendimento para a população mariense.
Valor Funcional – Um exemplo deste valor são os ilhéus dos Açores que constituem um autêntico local de berçário para muitas aves marinhas migratórias.
Valor Científico e Educativo – o Monumento Natural da Pedreira do Campo, Figueiral e Prainha “pelos seus níveis sedimentares, pela sua expressão fossilífera e pela sua idade (cerca de 5 milhões de anos) permitem estabelecer correlações estratigráficas inter-macaronésicas e da história geológica do Atlântico Nordeste e da colonização das ilhas macaronésicas” (Parque Natural de Santa Maria).


Imagem:  Monumento Natural da Pedreira do Campo, Figueiral e Prainha
Parque Natural de Santa Maria 


Dado todos os valores que a Geodiversidade apresenta é indubitável a sua necessidade de conservação, principalmente perante as ameaças que advém não só da alteração natural da paisagem, como de atividades antropogénicas, que constituem a maior ameaça à Geodiversidade, como é o exemplo das atividades recreativas e turísticas (Ex: Durante muito tempo a trajetória do Rally de Santa Maria passou pelo Barreiro da Faneca, um geossítio prioritário da ilha. Atualmente a prática desde desporto é proibida no local) ou da colheita de amostras geológicas para fins não científicos (Ex: Santa Maria é a única ilha dos Açores que contém sedimentos fossilíferos marinhos. Durante muito tempo, por falta de estudos científicos na área da paleontologia, era desconhecida a importância dos fósseis, sendo estes muito vezes retirados das jazidas para “recordação”).

Imagem: Barreiro da Faneca
Sentir e Interpretar o Ambiente dos Açores (SIARAM)

Ponderados os valores da Geodiversidade e as ameaças a que está sujeita, é inevitável abordarmos a importância da conservação da Geodiversidade. No entanto a Geoconservação, tal como o conceito de Geodiversidade ainda não é um termo consensual e conhecido por todos. Segundo Brilha (2005) este pode ter um sentido amplo que “tem como objetivo a utilização e gestão sustentável de toda a geodiversidade, englobando todo o tipo de recursos geológicos” e um sentido restrito “(..) entende apenas a conservação de certos elementos da geodiversidade que evidenciem um qualquer tipo de valor superlativo, isto é cujo valor se sobrepõe à média”.

Dentro deste valor restrito encontram-se os Geossítios – “sítios de interesse geológico que, pelas suas peculiaridades ou raridade, apresentam valor (ou relevância) científico, educativo, cultural, económico (e.g. turístico), cénico ou estético (e.g. paisagístico)” (Geoparque Açores). Ao conjunto de Geossítos, após a sua inventariação e caraterização, denomina-se de Património Geológico, que necessita de implementação de estratégias que visem o seu uso sustentável. Este Património Geológico é classificado e catalogado de acordo com uma (…) “série de critérios em que se atribui um dado valor (alto, médio, baixo) ao tipo de interesse do local proposto, atendendo à importância do seu conteúdo e possível utilização "(Canha, 2007).
 Imagem: Geossítios Prioritários de Santa Maria
Geoparque Açores

Dos vários critérios existentes (critérios de interesse cientifico; critérios de interesse pedagógico/didático; critérios de interesse cultural; critérios de interesse turístico), destaco o critério de interesse turístico, dada a sua inter-relação com outro conceito – Geoturismo – que segundo Moreira (2010) “pode ser definido como um novo segmento de turismo em áreas naturais, realizado por pessoas que têm o interesse em conhecer mais os aspetos geológicos e geomorfológicos de um determinado local, sendo esta a sua principal motivação na viagem”.

Não será o Geoturismo uma nova aposta para o desenvolvimento sustentável nos Açores?

Concluindo: Os termos Geodiversidade, Geoconservação e Património Geológico são interdependentes e relacionam-se entre si. A Geodiversidade apresenta valores de elevada riqueza e é fruto de vastas ameaças, sendo por isso necessário a sua conservação – Geoconservação - principalmente para a valorização e proteção dos sítios peculiares de interesse geológico – Geossítios - que no seu conjunto constituem o Património Geológico, que necessita de estratégicas, tendo por base o desenvolvimento sustentável (harmonização e equilíbrio do pilar social, económico e ambiental).


Referências Bibliográficas:
Brilha, J. (2005). Património  Geológico e Conservação – A Conservação da Natureza na sua vertente geológica. Viseu: Palimage Editores.
- Nunes, J.C; Lima E. ; Medeiros (2007). Os Açores, Ilhas de Geodiversidade – Contributo da Ilha de Santa Maria. Açores: Universidade dos Açores.- Secretaria Regional do Ambiente e do Mar. Parque Natural de Santa Maria. Disponível em http://parquesnaturais.azores.gov.pt/pt/. Acedido a 04 de maio de 2012.
- Associação Geoparque Açores. Geoparque Açores – nove ilhas, um geoparque. Disponível em http://azoresgeopark.com/. Acedido a 04 de maio de 2012.
- Canha, E. (2007). Património Natural da Ilha da Madeira. Estudo de um Local de Interesse Geológico – Cone de Piroclastos da N.ª. Sr.ª da Piedade. Dissertação do Mestrado em Ciência da Terra e da Vida. Departamento de Biologia. Universidade da Madeira.
- Moreira, J. (2010). Geoturismo: Uma Abordagem Histórico – Conceitual. Turismo e Paisagens Cársticas. Revista Científica da Secção de Espeleoturismo da Sociedade Brasileira de Espeleologia. Volume 3 –n.º1. Brasil. Disponível em http://www.sbe.com.br/tpc_v3_n1.asp. Acedido a 04 de maio de 2012. 

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Atividade 2 - Ameaças à Biodiversidade

O ano 2010 foi declarado pela Organização das Nações Unidas (ONU) como o Ano Internacional da Biodiversidade. Em 1992, durante a Cúpula da Terra, a maior convenção da história mundial sobre o meio ambiente, foi disponibilizada para assinatura a Convenção sobre a Diversidade Biológica (CDB),com o objetivo de conservar a biodiversidade existente, o seu uso sustentável e a repartição equitativa e justa dos benefícios gerados. Apesar dos 191 países signatários, a verdade é que esta convenção não atingiu os seus objetivos, evidenciando-se nos últimos anos um acentuado declínio da taxa anual da perda de biodiversidade.

No decorrer da Cúpula da Terra, o discurso de Severn Suziki , representante da Organização das Crianças em Defesa do Meio Ambiente, foi um verdadeiro "despertar" para as consequências das ações antropogénicas no meio ambiente.

Dada a situação, o Ano Internacional da Biodiversidade surge numa tentativa de unir esforços a nível mundial para a consciencialização dos cidadãos do mundo, incentivando-os a detetar ameaças e a promover soluções revolucionárias para combater as mesmas.


O Relatório final de avaliação - “Millennium Ecosystem Assessment” indica um conjunto de promotores de mudança que afetam indiretamente a biodiversidade, através da sua influência nos promotores diretos de mudança da biodiversidade. Existe uma inter-relação, determinada por fatores de causa (promotores indiretos) e efeito (promotores diretos).


Os promotores indiretos apontados pelo “Millennium Ecosystem Assessment” relacionam-se com os seguintes fatores: demográfico, económico, sociopolítico, ciência e tecnologia e cultural e religioso. Realmente torna-se difícil uma gestão sustentável dos recursos naturais quando já atingimos uma população mundial de 7 mil milhões, principalmente se olharmos para a globalização numa perspetiva capitalista, em que o que conta são os lucros que os países desenvolvidos poderão retirar da exploração da biodiversidade.


Como já foi referido, os promotores indiretos de mudança na biodiversidade, levam a mudanças nos promotores diretos, tais como:
  • Mudanças no uso e cobertura vegetal. Ex: a drenagem das zonas húmidas para obtenção de terrenos agrícolas leva a uma perda de biodiversidade, dado que as zonas húmidas são “ecossistemas muito dinâmicos e ricos na variedade de organismos que abrigam”. (Carapeto, 2010).

  • Introdução e remoção de espécies. Ex: a introdução de espécies de flora invasora nos Açores como o incenso (Pittosporum undulatum) e a roca-da-velha (Hedychium gardneranum) provocaram desequilíbrios no habitat de espécies florísticas endémicas, características da Floresta Laurissilva, o que consequentemente alberga consequências para as espécies de fauna.


    Imagem Pittosporum undulatum (incenso).
    Disponível no Portal da Biodiversidade dos Açores: http://www.azoresbioportal.angra.uac.pt/


  • Sobreexploração. Ex: a sobrexploração da amêijoa-boa (Tapes decussatus), um molusco pertencente à classe Bivalvia, que nos Açores apenas existe na Lagoa da Caldeira de Santo Cristo, na ilha de São Jorge, leva a que seja necessário a implementação de políticas com vista à sustentabilidade desta espécie.

  • Poluição. Ex: A eutrofização causada pelo excesso de nutrientes na água conduz à perda de biodiversidade, como é o caso da Lagoa das Sete-Cidades e das Furnas (ilha de São Miguel). “As Lagoas das Sete-Cidades e Furnas, situadas na Ilha de S. Miguel (Açores), têm vindo a sofrer um processo de eutrofização potenciado pela existência de exploração agro-pecuária intensiva no seio das respectivas bacias hidrográficas. A degradação da qualidade da água e as alterações no ecossistema aquático têm preocupado a população em geral e a administração pública regional em particular, que tem procurado acompanhar a evolução deste problema através da realização de campanhas periódicas de monitorização” (Santos, M. et al, 2004).

  • Alterações climáticas (causas antropogénicas). As mudanças climáticas podem levar à alteração dos ecossistemas terrestres e marinhos, reduzindo a sua produtividade, podendo levar mesmo à extinção de espécies faunísticas e florísticas que não se consigam adaptar rapidamente. Em 2007 o Painel Intergovernamental sobre alterações climáticas referiu que “o aumento global das temperaturas normais, observado a partir da segunda metade do século XX, deve-se sobretudo ao crescimento observado de emissões de gases de origem antropogénica com efeito de estufa”. É urgente refletirmos se estamos a honrar o compromisso que tomamos no Protocolo de Quioto.


    As ameaças apresentadas remetem-nos para a questão apresentada por Myers: “How long do we have?”. Cada vez mais existem áreas protegidas e diversos enquadramentos legislativos a nível internacional, regional e local. Mas será que ainda temos tempo para evitar a destruição de habitats e a extinção de espécies?Necessitamos de ter sempre em mente que o Homem faz parte do ecossistema, logo a perda de biodiversidade afeta a nossa qualidade de vida, assim como poderá colocar em risco a sobrevivência humana.

Bibliografia:
- Carapeto, C. (2010). Zonas Húmidas Naturais e Artificiais: características, proteção e benefícios. Editora Bubok.
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